O circo dos videojogos está a chegar
Todos os anos há uma data em que o mundo dos videojogos entra em modo turbo. É a semana da E3, que arranca já na segunda-feira.
A E3 - Electronic Entertainment Expo - é o maior evento do mundo relacionado com os videojogos. Uma feira de acesso restrito a profissionais da indústria que se realiza em Los Angeles. É lá que são feitos os grandes anúncios e reveladas as maiores novidades do mundo dos videojogos: novas consolas, novos jogos, novas apostas e revelações surpresa.
E todos os anos surge também a grande dúvida: "A E3 ainda faz sentido?"
E também, claro, a profecia soturna: "A E3 está a morrer."
Se a E3 é o maior evento de videojogos do mundo porquê esta dúvida?
Os rumores da morte da E3 não são completamente infundados. A principal razão para se questionar a relevância deste evento até se explica de forma simples:
A E3 começou em 1995. Nesse longínquo ano do milénio passado os videojogos eram vendidos sobretudo nos estabelecimentos comerciais. O jornalismo era publicado sobretudo em revistas. E as imagens e vídeos eram partilhados sobretudo por correio... daquele que é entregue pelo carteiro.
Neste cenário retrotecnológico em que os jogos não eram vendidos pela internet e por download, em que não havia sites de notícias a publicar todas as novidades quase ao segundo e em que não se podia aceder a vídeos de forma quase instantânea no YouTube ou no SAPO Vídeos, era quase essencial ter um local e uma data em que toda a industria dos videojogos se pudesse reunir para ficar a conhecer as novidades e fazer novos negócios.
21 anos depois, a informação está acessível a todos e a qualquer hora. É possível assistir aos principais anúncios e apresentações em direto através da Internet. Seja do ponto de vista dos negócios ou do ponto de vista jornalístico, a E3 já não é necessária. Os profissionais desta indústria podem fazer o seu trabalho sem lá marcarem presença. Porquê gastar dinheiro em viagens e alojamento para um trabalho que se pode fazer em casa ou no escritório? E, no caso das editoras, porquê gastar fortunas em grandes stands e mega-apresentações se basta colocar a informação online para todo o mundo lhe aceder?
De facto já houve algumas "desistências". A Nintendo deixou de fazer as habituais apresentações ao vivo na E3 em troca de vídeos previamente gravados que publicam online no início do evento. Aliás, mesmo essas apresentações já eram feitas "fora" da E3. A Nintendo fazia, e a Sony e Microsoft ainda fazem, as suas apresentações em eventos separados, nos 2 dias que antecedem a E3. No recinto do evento apenas realizam demonstrações e reuniões nos seus stands.
Mas este ano houve mais desistências dignas de nota. A Electronic Arts e a Activision, duas das maiores editoras de videojogos a nível mundial, anunciaram que não vão estar presentes na E3. A Disney também não, mas isso é porque desistiram recentemente de publicar videojogos para apostarem em licenciar as suas marcas a outras empresas.
E pronto. Está tudo a sair da E3. Deve ser o fim.
Mas não é. Apesar da vontade de algumas editoras de cortarem custos e de realizarem os seus próprios eventos, alguns até abertos ao público, a verdade é que todos continuam a orbitar esse evento principal que é a E3. As apresentações da PlayStation e da Xbox em Los Angeles nos dias que antecedem a E3 continuam a ser as suas "apresentações na E3". A Electronic Arts não vai estar na E3 mas também vai realizar eventos em Los Angeles na semana da E3.
E porquê?
Porque é o facto de toda a indústria dos videojogos convergir para um único local na mesma semana que faz com que o mundo preste atenção. Porque é nesta altura e neste local que todos estão recetivos e expectantes, a aguardar pelas novidades. E não são só os fãs e os sites e revistas especializados. Nesta semana os órgãos de comunicação social generalistas também prestam atenção e as novidades chegam a mais pessoas.
É o circo dos videojogos a chegar à cidade! Há música, barulho e coisas fantásticas para ver. E toda a gente olha e presta atenção.
E é este o dilema da indústria dos videojogos. Marcar presença na E3 custa dinheiro, exige tempo e esforço, requer trabalho e preparação. É mais fácil ficar em casa e ir fazendo as coisas ao nosso ritmo e à medida das nossas necessidades, sem a interferência dos anúncios dos nossos concorrentes. Mas será que alguém vai reparar?
Não sei se a E3 vai durar para sempre ou sequer se vai durar muitos mais anos, mas se terminar vai fazer falta à indústria. Há outros eventos de relevância internacional e muitos eventos locais (por cá temos a Lisboa Games Week). Mas não são a mesma coisa.
A E3 tem uma história longa que lhe permite manter o estatuto de "maior evento de videojogos do mundo". É uma espécie de galinha dos ovos de ouro. E há cada vez mais empresas e profissionais da indústria dos videojogos que não querem continuar a alimentar esta galinha, por motivos que são válidos. Mas se a galinha morrer vão de certeza ficar mais pobres.
E a verdade é que, apesar desta reflexão toda sobre a E3, o que me interessa mesmo são todas as novidades que vão aparecer já a partir da próxima segunda-feira.
"There's no business like videogame business!"