Consola de cartão ou pepita de ouro?
O Nintendo Labo pode parecer uma ideia descabida, mas a maioria das pessoas não está a ver o potencial enorme que se esconde neste conceito.
É motivo de chacota um pouco por todo o lado, entre gamers e também entre meros curiosos. O próximo grande lançamento da Nintendo é... cartão.
Sim, cartão de papel. Daquele usado para embalar as mais variadas coisas.
Mais precisamente, é um conjunto de jogos que inclui uma série de acessórios de cartão que o jogador deve destacar, dobrar e montar para depois jogar. Com a ajuda de alguns elásticos e cordéis conseguem-se coisas muito interessantes. Podem ver o conceito em ação no vídeo de apresentação da Nintendo:
Mas as críticas são muitas: o preço é elevado (70€ para o Kit Sortido e 80€ para o Kit Robô), o cartão é frágil e por isso vai-se estragar num instante, os jogos são básicos...
Será mesmo assim?
O preço pode de facto parecer elevado e afastar alguns potenciais compradores, mas eu disse o mesmo sobre o preço da Switch e as vendas foram um sucesso.
Quanto à fragilidade do cartão é que já discordo. Não é por acaso que a maioria dos produtos são embalados e transportados em caixas de cartão: é um material bastante resistente e suficientemente flexível para resistir a uns bons amassos. O plástico pode parecer mais rijo e durável, mas a verdade é que facilmente parte ou dobra. E quem já experimentou o Nintendo Labo diz que o cartão usado é resistente e adequado.
Obviamente que todo o parágrafo anterior deve ser ignorado por quem tem gatos.
Quanto aos jogos serem básicos...
É aqui que a maioria das pessoas está a ver mal a coisa. E é um erro perfeitamente aceitável. É que a Nintendo quase que escondeu o verdadeiro valor do Nintendo Labo.
Isto não é um pequeno conjunto de jogos simples com acessórios de cartão. Isso é só a introdução ao conceito. Discretamente, no meio dos vários mini-jogos do Nintendo Labo, está o modo "Toy-Con Garage". E é aí que as coisas se tornam interessantes.
O modo "garagem" é nada menos que uma interface visual e simples que permite programar as ações e reações dos comandos e do ecrã da consola. E as opções são muitas. Os comandos da Switch não têm apenas botões, têm também acelerómetros, microfone, sensor de infravermelhos e muito mais.
Quando aliamos esta panóplia de opções e a possibilidade de as programar de forma simples com a manuseabilidade do cartão, temos uma plataforma que nos permite construir todo o tipo de maquinetas, brinquedos e jogos que conseguirmos imaginar. É esse o foco dos vídeos mais recentes da Nintendo:
É por isso que os acessórios do Nintendo Labo são de cartão. É para ser fácil acrescentar, reconstruir ou criar algo de novo, praticamente sem custos ou dificuldade.
O surgimento recente das impressoras 3D permitiu o desenvolvimento de uma comunidade "maker": inventores que agora facilmente podem prototipar as suas criações em formato físico. Mas o cartão já era usado antes disso. A própria Nintendo usou cartão para alguns protótipos da Wii U e a Google usou o mesmo conceito para o seu primeiro visor de realidade virtual, para além de estar atualmente a vender alguns produtos de cartão. É muito mais barato e acessível que uma impressora 3D.
E não custa imaginar que rapidamente surjam comunidades online de pessoas a partilhar ideias, projetos e planos para imprimir e recortar novas peças e criar novas construções.
Tudo isto é uma excelente plataforma para pôr crianças e adultos a "aprender a construir". Uma evolução natural do "aprender a programar", que devia ser para todos.
Resta saber se todo este potencial se vai concretizar. O Nintendo Labo pode acabar por ser uma moda passageira. Nem sequer é a primeira "plataforma" do género. A Lego tem a sua linha Mindstorms e muitas outras marcas têm ofertas mais ou menos parecidas.
Mas o potencial está lá. E de uma forma extremamente simples e acessível. Desse ponto de vista é possivelmente o melhor produto do género que conheço. E merece no mínimo a nossa atenção.